quinta-feira, 11 de junho de 2009

9 razões para um coração solitário


A iminência do Dia dos Namorados não me assusta, mas incomoda. Apesar de saber que se trata de uma data puramente comercial, não consigo ficar indiferente a ela. Estar sozinho dói. Me sinto levemente deprimido, envolto na mais pura melancolia. Uma solidão que nem a companhia dos amigos é capaz de aplacar. Um vazio profundo que, ironicamente, me acompanha e conforta. Esse dito alívio, porém, ocorre mais em função da comodidade de não agir do que pelo real alento que a escuridão me traz.

De qualquer forma, é 12 de junho. Preciso me enfrentar. E eis que é chegado o momento de ponderar sobre os motivos que, afinal, me mantém preso às garras da minha própria solteirice:

1) Espero demais da outra pessoa. Tento encontrar um molde preconcebido e facilmente me frustro por não ser capaz de detectá-lo em meio à multidão. Embora eu saiba que perfeição não existe, que as pessoas são diferentes umas das outras e blá, blá, blá, não abro mão da satisfação completa dos meus sonhos e desejos. Não é o desespero que me fará agarrar qualquer coisa que me vier pela frente. Estabeleço exigências como todo mundo, até porque as pessoas esperam — e exigem — demais de mim. E isso nada mais é do que uma contrarresposta. Então me sinto menos culpado.

2) Sou muito temperamental. Eu me vejo como uma pessoa muito complicada. Um emaranhado de definições e imprecisões. Chato e insistente. Doce e ao mesmo tempo azedo. Receptivo e fechado, apesar do paradoxo. Minha mãe costuma dizer que eu corto as pessoas como se fossem inço. Discordo. Diria que procuro evitá-las, isso sim. Deixo de responder recados, bloqueio-as no MSN, torno a falar com elas, desapareço por uns tempos e depois volto à superfície. Minha disposição — isto é, o ânimo ou a falta dele — varia conforme meu humor. Mudo constantemente de ideia, me deixo deprimir. Subo aos céus e despenco direto para o inferno (geralmente com uma escala no planeta Terra).

3) Tenho hábitos de solteirona. Namorar exige desprendimento, atenção, troca de elogios e lembrancinhas, disposição para discutir e depois fazer as pazes... Dizem que não há nada melhor do que ter alguém ao lado, enrolado nos cobertores num dia de chuva, enquanto se assiste a um filme. Que coisa mais cafona! (Confesso que adoraria fazê-lo se estivesse comprometido com alguém.) Mas acho que comigo não daria certo. Detesto interrupções durante a sessão. Comentários, pausas, reclamações. Interrupções, mesmo, só se forem minhas: gosto de parar o filme, tomar nota do vocabulário novo, transcrever passagens, retroceder e avançar. Egoísmo justificado. É isso que dá passar meses — e anos! — solteiro. A gente cria hábitos bizarros, o que pode ser incômodo quando voltarmos a nos relacionar com alguém.

4) Não abro mão da minha individualidade. Você corre a semana inteira e então chega o final de semana. Beleza! Salvo aqueles que possuem a dádiva de não trabalhar aos sábados, só lhe resta o domingo para ficar de pernas pro ar — ou então terminar aquele bendito trabalho de faculdade. Mas o que poderia ser o paraíso na Terra se torna o inferno no Céu. É a tal da “obrigação” de encontrar a pessoa amada: tomar aquele banho, perfumar-se todo, vestir a melhor roupa e ir ao encontro dela. Quanta função! No fundo, não gostaria de abrir mão do meu único momento a sós para cumprir esse dever do namoro. Há coisa melhor do que esticar os pés numa rede ou andar feito mendigo pela casa? Nada de beijinhos e carinhos e afagos e abraços. Só você e mais ninguém. (Desconfio de que esse item esteja intimamente ligado ao anterior. E isso não é mera coincidência.)

5) Sinto ciúmes. Geralmente me controlo. Confio no meu taco, dou uma de gostoso e faço carão de “tô-nem-aí”. Mas não adianta. Ele insiste em me invadir, corroendo minhas entranhas com seu veneno, e me faz sentir espasmos no estômago. Não, não. Não tenho culhão para aguentar o ciúme. Aquele ex-namorado? Aquele contato d’Orkut? O colega garanhão do trabalho? O galã da faculdade? Exijo distância! Errado? Totalmente. A atitude mais acertada e madura seria encará-los numa boa. Quem sabe até conviver com eles, no máximo que nos permite o nosso cinismo civilizado. Mas quem disse que esse sentimento é racional? Sem contar o ciúme que tenho das minhas coisas. Não divido nada. Escova de dente, livro, computador, roupa. Nadinha.

6) Sou “intenso demais”. Você entendeu? Pois é, nem eu. Mas é esta a principal explicação deles para justificar o rompimento. Talvez estejam certos. Costumo me entregar de corpo e alma. Me revelo nu desde o início — o que não significa, é claro, que eu vá para a cama no primeiro encontro. “Nu”, aqui, só no sentido figurado. Me mostro da maneira mais natural e honesta possível. Abro meus sentimentos, expresso o que penso e sinto, descubro o manto que me envolve e protege. Evito tergiversações, rodeios, joguinhos de conquista. Vou direto ao que interessa. I’m straightforward. Além do mais, procuro degustar cada momento com o máximo de intensidade. Certa vez, disse que gostaria de amar em grandes goles. “Quero amor que afoga, quero amor em grandes golfadas”, escrevi. Exagero talvez? Pode até ser. Mas obviamente não forço a barra. Ele não procura isso, não se sente à vontade comigo? A porta está aberta. Não sou viúva-negra.

7) Demonstro inteligência. E isso intimida as pessoas. O cara conversa com você, percebe o tom e o conteúdo da sua conversa e foge. Desaparece. Torna-se um grão de ervilha num campo de soja. Talvez eu funcione ao revés. Para mim, inteligência é uma baita qualidade. É, aliás, um dos critérios que levo em consideração na hora da escolha de um pretendente. Gosto de me sentir intelectualmente desafiado. No entanto, o preenchimento desse quesito não parece ser condição sine qua non para muita gente. Elas buscam a cereja do bolo, o abdômen bem trabalhado, o tanque de lavar roupa, o rostinho apolíneo. Divagações acerca da efemeridade da vida? Soluções para o aquecimento global? Que nada. “Eu só penso em beijar.”

8) Sou mão-de-vaca. Você dá um duro danado, acorda cedo num sábado de manhã, trabalha um mês inteiro e recebe o merecido (e sempre insuficiente) salário. Então chegam as datas comemorativas e, junto com elas, a obrigação presentear. Sair para jantar. Pegar um cineminha e dar uma de cavalheiro. Ora bolas! Gastar, gastar, gastar. A vida de solteiro ensina a economizar. Se for para comprar um novo par de sapatos — ou uma camisa nova —, tudo bem. Desde que seja para mim.

9) Moro na cidade errada. Definitivamente a geografia não me favorece. Cidade pequena não oferece muitas opções de entretenimento e, consequentemente, a gama de partidos interessantes — e disponíveis, frise-se — diminui.

Sim, eu sou uma pessoa solitária. E solteira. Por quanto tempo permanecerei nesse estado? Só Deus sabe. Enquanto isso, convido São Valentim para um café e ouço a prece de Clarice Lispector:

“Meu Deus, me dê a coragem de considerar esse vazio como uma plenitude. (...) Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.”

Feliz Dia dos Namorados!

2 comentários:

  1. Preciosa é cada linha do que tu escreve, irmão. Tudo com pés, cabeça e razão. Obviamente, afirmo isso por encontrar-me na mesma situação, da primeira à última palavra, e convicta! É exatamente um enchente de nós mesmos que lava a alma, pisadinha em feitos anteriores, remoldada, revista e atualizada, a caminho dos novos passos, certamente, mais cuidadosos. Esse tempo de 'egoismo justificado' é a terapia nossa de cada dia.

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  2. A definição exatamente e minunciosamente sobre aquilo que mais gastamos tempo,pensamentos e respostas para as questões.Amor,paixão,alguem á quem dá-los,mas o chá da exigência é a paciência.

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